ENSINO DE
HISTÓRIA NO ENSINO FUNDAMENTAL: UMA ANÁLISE DAS DIRETRIZES CURRICULARES DO
PARANÁ
Rebecca Carolline Moraes da Silva
UEL
Este
trabalho objetiva a análise do caderno de História das Diretrizes Curriculares
Estaduais do Paraná, baseada no diálogo com os textos “O Currículo como prática
de significação”, de Tomaz Tadeu da Silva (2001), “Concepções de aprendizagem
histórica presentes em propostas curriculares brasileiras”, de Maria
Auxiliadora Schmidt (2009), “Ensino de História: conteúdos e conceitos básicos”,
de Holien Gonçalves Bezerra (2003) e, por fim, “Como
selecionar conteúdo”, de Circe Bittencourt (2004). Para uma conversa mais
específica, foi recortado o tópico titulado “Dimensões do Conhecimento” da
primeira parte do caderno que discorre sobre A Educação Básica e a opção pelo Currículo.
Silva
(2001) nos apresenta numa visão ampla, do currículo como se tratando de:
conteúdos selecionados, experiências de aprendizagem dos alunos, projetos
pedagógicos, avaliação. Ou seja, o currículo vai desde o macrotexto até o
microtexto (das DCEs até a sala de aula), dividindo-se em três tipos: currículo
prescrito (oficial, escrito), currículo oculto (regras da escola, disposição
dos alunos, etc.) e currículo real (transposição do prescrito para a prática da
sala de aula, com os devidos ajustes necessários em cada caso). Para o autor, o
currículo está dentro de uma cultura e está dentro das relações sociais e,
consequentemente, das relações de poder. Schmidt (2009) afirma que o currículo
instituindo formas de construir a escolarização, elaborando identidades e
visões de mundo, pode ser chamado de Código Disciplinar. O código disciplinar
da História é que define as ideias e valores, suposições e rotinas que
legitimam a função educativa atribuída à História. O código disciplinar define
e regula o conhecimento histórico que é ensinado nas salas de aula.
Ainda
segundo Silva (2001), na sociedade da nova ordem mundial, as capacidades
humanas foram ampliadas, as identidades híbridas foram reconhecidas, porém,
essa é a sociedade da tragédia, porque foram ampliadas as capacidades de
exploração do ser humano e, assim, houve a ampliação das desigualdades. Desta
forma, este autor analisa o currículo para pensar o papel do professor, porque
a educação forma dois tipos de sujeitos: um capacitado a explorar as novas
possibilidades do mercado, outro insatisfeito que vai enfrentar as filas do
desemprego. Então a problemática é dirigida no sentido de descobrir como o
currículo pode mudar essa realidade. Schmidt (2009) trabalha a questão das
concepções de aprendizagens nos currículos (especificamente os Parâmetros
Nacionais Curriculares de 1998) baseado nos insucessos escolares no que
concerne a aprendizagens significativas para a formação da consciência
histórica, pois a lógica do capital estaria formando uma contraconsciência.
Nesse sentido, seria necessário romper com essa lógica para criar alternativas
educacionais. Silva (2001) afirma que o currículo depende do contexto da
educação no país, no estado, município, até chegar à escola; ele determina as
funções de cada um dentro da escola e abre caminho para a formação de
identidades. Por isso, o professor tem que participar da construção dele e
estar ciente do que está sendo decidido.
Neste
ponto, podemos visualizar o nascimento das Diretrizes Curriculares Estaduais do
Paraná: ao longo de cinco anos houve debates e correspondências entre especialistas
e professores da rede básica de ensino para que o texto final fosse o melhor e
também mais próximo da realidade das salas de aula. Segundo Yvelise Freitas de
Souza Arco-Verde, Secretária do Estado da Educação do Paraná, quando as
Diretrizes foram publicadas, a maioria das pessoas acreditava e confiava à
escola ser o meio mais concreto de acesso aos saberes (conforme Carta da
Secretária da Educação, publicada no início do caderno das Diretrizes
Curriculares Estaduais do Paraná). Pensando nisso, o recorte feito acerca das
dimensões do conhecimento ressalta que o objetivo da educação básica é de
oferecer ao aluno o necessário para que ele enfrente as transformações das
realidades social, econômica e política (Cf. SEEP, 2008, p. 20).
Para
isso, as Diretrizes Curriculares foram escritas com a finalidade de cumprir
esse papel. Destaca-se a importância dos conteúdos ensinados e selecionados
pelos professores em seus planos de ensino. Conforme Sacristán (2000, apud SEEP, 2008, p. 24), “sem conteúdo
não há ensino” e por isso sua seleção é parte fundamental do processo de
ensino. E, conforme as Diretrizes, quem tem que fazer essa seleção é o próprio
professor da disciplina, que está diariamente lindando com suas salas de aula e
convivendo com os alunos pode definir quais são os conteúdos que serão melhor
aproveitados por eles. Circe Bittencourt (2004), defende que a seleção de
conteúdo constitui a base do domínio do saber disciplinar do professor e deve
ser feito porque não se pode ensinar toda a História e ainda atender aos
interesses da nova geração com as condições atuais de ensino. Da mesma forma,
Holien Bezerra (2003) afirma que é dever da escola e direito do aluno de ensino
fundamental trabalhar com conhecimentos que se consideram necessários para o
exercício da cidadania. Não tem como trabalhar com toda a trajetória da
humanidade, então tem que fazer escolhas e seleções de conteúdos.
Aliando
teoria e prática, os professores devem, como sugeriu Silva (2001), participar
ativamente da elaboração dos currículos e, considerando que currículo não é
somente o oficial, através de seus planos de ensino e práticas diárias há uma
constante construção curricular a partir dos conceitos estruturantes de cada
disciplina, na qual as práticas pedagógicas se fundamentam. Bezerra (2003, p.
39) diz que “os conteúdos ocupam um papel central no processo de
ensino-apredizagem, e sua seleção e escolha devem estar em consonância com as
problemáticas sociais marcantes e cada momento histórico”. Entretanto,
Bittencourt (2004) afirma que essa autonomia do trabalho docente em escolher
assuntos para suas diferentes salas acaba sendo uma dificuldade para os
professores, pois não conseguem selecionar conteúdos apropriados para as
diferentes situações escolares de maneira eficaz, o que torna de certa forma
utópica a elaboração do plano de ensino
vinculado à realidade e às necessidades de suas diferentes turmas e escolas de atuação, contendo os conteúdos específicos a serem trabalhados nos bimestres, trimestres ou semestres letivos, bem como as especificações metodológicas que fundamentam a relação ensino/ aprendizagem, além dos critérios e instrumentos que objetivam a avaliação no cotidiano escolar (SEEP, 2008, pp. 26-27).
Outro aspecto
importante é o da interdisciplinaridade, que evidenciam as limitações das
disciplinas se isoladas e, ao mesmo tempo, a singularidade de cada uma. As
disciplinas não são fechadas em si, mas, em conjunto, possibilitam a ampliação
da compreensão dos conteúdos nas dimensões filosófica, artística e científica
do conhecimento (Cf. SEEP. 2008, p. 27). Além disso, a interdisciplinaridade
possibilita a promoção da contextualização sócio-histórica, ou seja, a relação
com os conhecimentos prévios dos alunos. Silva (2001) lembra que tem-se que
sempre levar em consideração os outros "currículos" vivenciados pelos
alunos, dos outros espaços de seu dia-a-dia e isso nos leva de volta à
importância da práxis no processo de ensino e aprendizagem: levar em
consideração os conhecimentos prévios contribui para que o novo conhecimento
ganhe significado para o aluno e seja mais facilmente incorporado às suas redes
cognitivas, ou seja, aquilo que lhe parecia sem sentido seja problematizado e
apreendido.
Bezerra
(2003) alerta para a obrigatoriedade imposta pela lei 9394/96 que regulamenta
as Diretrizes e Bases da Educação estabelece o caminho da educação básica, em
seu artigo 22 define que: “A educação básica tem por finalidades desenvolver o
educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da
cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos
posteriores.” Então toda a formulação do “código disciplinar” vincula a
educação à prática social dos alunos, ao mundo do trabalho, à formação para a
cidadania. Nas Diretrizes, porém, é alertado o perigo do professor, ao cumprir
com essa questão, empobreça a construção do conhecimento, pois “reduzir a
abordagem pedagógica aos limites da vivência do aluno compromete o
desenvolvimento de sua capacidade crítica de compreensão da abrangência dos
fatos e fenômenos” (SEEP,
2008, p. 28).
Com isso, enfatizam que os conhecimentos prévios dos alunos devem ser apenas o
ponto de partida para uma contextualização mais ampla e mais crítica, para o
desenvolvimento do pensamento abstrato e da sistematização do conhecimento (Cf. SEEP, 2009, p. 28). Os
conhecimentos dos alunos devem ser reestruturados e sistematizados a partir dos
conceitos fundamentais das ciências de referência.
Referências
BEZERRA,
Holien. Ensino de História: conteúdos e conceitos básicos. In: KARNAL, Leandro
(org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. São
Paulo: Contexto, 2003, p.37- 48.
BITTENCOURT, Circe Maria. Como
selecionar conteúdo. In: BITTENCOURT, Circe Maria. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Editora
Cortez, 2004.
SECRETARIA de Estado da Educação
do Paraná. Diretrizes curriculares da
Educação Fundamental da rede de Educação Básica do Estado do Paraná.
Curitiba: SEED-PR, 2008. Disponível em <http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/diretrizes/dce_hist.pdf>
SILVA,
Tomaz Tadeu da. O currículo como prática de significação. In: SILVA, T. T. O currículo como fetiche. Belo
Horizonte: Autêntica, 2001.
SCHMIDT,
Maria Auxiliadora. Concepções de aprendizagem histórica presentes em propostas
curriculares brasileiras. In: História
Revista, v. 14, n. 01, p. 203-213, jan/jun 2009. Disponível em <http://www.revistas.ufg.br/index.php/historia/article/view/8176/5871>
PERGUNTAS
Ola Rebecca, gostei muito de seu texto e vem de encontro com as
pesquisa que realizo no campo do ensino em história. Gostaria de saber
a sua opinião a respeito das metodologias possíveis para contribuir
com a ação efetiva da aprendizagem e que gere interesse no aluno sobre
as questões do conteúdo em si. Você poderia citar projetos ou
atualizações curriculares que tenham apresentado um certo índice de
sucesso? Obrigada por Maria Cristina Pastore
Olá Maria Cristina Pastore. Obrigada pelo interesse pelo texto e pela pergunta.
Minha opinião é que devemos conhecer o contexto que nossos alunos estão inseridos, conhecer o que certa faixa etária gosta, qual é a "modinha da vez" entre eles, para que a partir dessas práticas deles possamos criar abordagens sobre os conteúdos que trabalhamos com eles, além de atividades que trabalhem com a criatividade deles (essas são as que eles mais se interessam).
Por experiência, trabalhar com criação de paródias e panfletos tem sido uma maneira de conseguir a atenção e dedicação dos alunos, além de transformá-los em protagonistas da aula. Sobre projetos curriculares, duas escola em minha cidade, em minha opinião, têm trabalhado de maneira efetiva para aprendizagem significativa: elas tematizaram (por ex: trabalho, alimentação, empreendedorismo) e todas as disciplinas trabalham em prol desse tema; acredito que seja uma excelente maneira de trazer os conteúdos para próximo da vida dos alunos.
Também creio que existem outras possibilidades, como trabalhar com cinema, games, etc, coisas que fazem parte do cotidiano dos alunos. E pararmos para nos por no lugar deles - "o que eu gostaria de fazer com essa idade" - também é uma boa maneira de pensar na maneira como trabalhamos com esses alunos.
Espero ajudar. Abraço.
pesquisa que realizo no campo do ensino em história. Gostaria de saber
a sua opinião a respeito das metodologias possíveis para contribuir
com a ação efetiva da aprendizagem e que gere interesse no aluno sobre
as questões do conteúdo em si. Você poderia citar projetos ou
atualizações curriculares que tenham apresentado um certo índice de
sucesso? Obrigada por Maria Cristina Pastore
Olá Maria Cristina Pastore. Obrigada pelo interesse pelo texto e pela pergunta.
Minha opinião é que devemos conhecer o contexto que nossos alunos estão inseridos, conhecer o que certa faixa etária gosta, qual é a "modinha da vez" entre eles, para que a partir dessas práticas deles possamos criar abordagens sobre os conteúdos que trabalhamos com eles, além de atividades que trabalhem com a criatividade deles (essas são as que eles mais se interessam).
Por experiência, trabalhar com criação de paródias e panfletos tem sido uma maneira de conseguir a atenção e dedicação dos alunos, além de transformá-los em protagonistas da aula. Sobre projetos curriculares, duas escola em minha cidade, em minha opinião, têm trabalhado de maneira efetiva para aprendizagem significativa: elas tematizaram (por ex: trabalho, alimentação, empreendedorismo) e todas as disciplinas trabalham em prol desse tema; acredito que seja uma excelente maneira de trazer os conteúdos para próximo da vida dos alunos.
Também creio que existem outras possibilidades, como trabalhar com cinema, games, etc, coisas que fazem parte do cotidiano dos alunos. E pararmos para nos por no lugar deles - "o que eu gostaria de fazer com essa idade" - também é uma boa maneira de pensar na maneira como trabalhamos com esses alunos.
Espero ajudar. Abraço.
Olá, em outro artigo fiz uma pergunta parecida e repito-a agora afim de ter mais apontamentos sobre a questão: como podemos querer que o aluno encare a avaliação como parte do processo de aprendizagem se ela em si e dentro da estrutura do curriculum escolar não se configura como tal?!
ResponderExcluirOlá Rafael, obrigada por sua pergunta.
ExcluirCom certeza esta é uma tarefa difícil se consideramos a ideia de avaliação do currículo prescrito. No entanto, acredito que isso também dependa da nossa visão (ou seja, da visão do professor) em relação à avaliação. Se este compreende que a avaliação deve fazer parte do processo de aprendizagem, ele procura metodologias avaliativas compatíveis com sua postura. Eu, particularmente, não gosto de aplicar provas como avaliação (isso na minha curta experiência de estágio e PIBID); geralmente procuro fazer avaliação seriada, de maneira que em todas as aulas aplico uma atividade referente ao assunto tratado - isso ajuda também na concentração dos alunos durante a aula - ou atividades que 'cutuquem' a criatividade dos alunos, como criação de paródias, panfletos, telejornais etc, isso dentro de cada assunto. Há escolas que exigem a prova escrita, ok, aplicamos, porém observando que tipo de perguntas colocar, que habilidades queremos que os alunos demonstrem ao responder esta prova e, claro, ser coerente com isso na hora da correção. Em conclusão, acredito que não seja nem necessário explicar aos alunos que a avaliação seja parte do processo de aprendizagem se a praticarmos como tal.
Obrigada.