Lúcio Ambrósio Hupalo

O QUE EU QUERO ESTUDAR EM HISTÓRIA: UMA EXPERIÊNCIA A PARTIR DO ESTUDO DA HISTÓRIA LOCAL
Lúcio Ambrosio Hupalo
UNESPAR


No ano de 2013 tivemos a oportunidade de trabalhar a disciplina de História com turmas de 9º ano do Ensino Fundamental e 3ª séries do Ensino Médio no Colégio Estadual Pedro Araújo Neto, em General Carneiro – PR. Ao longo do primeiro bimestre, percebemos grande desinteresse nos estudos dos conteúdos propostos para o ano letivo. Em meio a essa percepção, decidimos realizar uma avaliação para diagnosticarmos possibilidades de melhora em nossas aulas e também para conhecermos as expectativas dos alunos diante do papel da escola, do conhecimento e da disciplina de História para os mesmos.

A devolutiva dos alunos apontou as aulas de História como chatas e os conteúdos irrelevantes e/ou desinteressantes para os mesmos. Nas sugestões de assuntos que gostariam que fossem estudados apareceu com grande força o conhecimento da História Local, qual seja a formação histórica do município de General Carneiro. Diante disso, chegamos a três constatações:

1. O conhecimento que tiveram sobre a História Local durante os anos anteriores de estudos foram insuficientes;2. Teríamos que parar nosso planejamento docente elaborado no inicio do ano para contemplar o desejo das turmas;3. Teríamos que ir ao estudo da História do município de General Carneiro para realizarmos o trabalho em sala de aula, visto que nosso conhecimento sobre o assunto era bem reduzido devido até ao fato de nascermos e morarmos em União da Vitória - PR;

Na biblioteca da escola fomos à procura de materiais que nos fundamentassem teoricamente para as aulas que viriam. Não havia muita coisa! Algum material mimeografado elaborado pela Secretaria Municipal de Educação e o livro “História do município de General Carneiro” de Joaquim Osório Ribas.

Antes de explorarmos esses materiais realizamos uma atividade em sala de aula para sabermos sobre a origem das famílias desses alunos e constatamos que boa parte das mesmas havia chegado de outras cidades para, por vários motivos – assentamento da Reforma Agrária, trabalho nas empresas madeireiras, dentre outros – morar em General Carneiro. Por isso só já se explicava um pouco do desconhecimento sobre a história da cidade. Outras constatações: alguns alunos eram descendentes dos primeiros imigrantes ucranianos que se instalaram em 1892 nas margens do Rio Jangada e outros ainda tinham entre seus antepassados os “bugres”. As possibilidades se abriam. De uma aula de 50 minutos, várias temáticas a serem abordadas tendo como fio condutor a História Local. Uma obviedade, ainda mais que as Diretrizes Curriculares da Educação Básica de História do Estado do Paraná (DCE) destacam que

(...) a proposta metodológica de partir das histórias locais e do Brasil para a Geral possibilita a abordagem da história regional, o que atende a Lei n.13381/01, a qual torna obrigatória, no Ensino Fundamental e Médio da Rede Pública Estadual, o trabalho com os conteúdos de História do Paraná. (PARANÁ, 2008, p.75).

Ainda que a proposta das DCE estivesse contemplada dentro de nosso planejamento docente, foi a demanda dos alunos que a tornava mais necessária. O livro História do município de General Carneiro de Joaquim Osório Ribas serviu como fonte histórica muito aproveitada para trabalhar sobre a presença indígena no município. O termo bugre, “que ao longo da História foi utilizado para, primeiramente definir o individuo herético e que depois passou a designar o índio não catequizado” (MELLO apud PARANÁ, 2007, p.17) e que aparecia na descendência de alguns alunos se redefinia nos povos Kaingang e Xokleng que ocupavam o território onde hoje é o município. Isso nos levou ao estudo sobre os povos indígenas do Paraná e nos fez trazer para a sala de aula obras importantes para o conhecimento dos alunos como Os índios e a civilização, de Darcy Ribeiro, As guerras dos índios Kaingang, de Lúcio Tadeu Mota e Os Xokleng de Rio dos Pardos, dissertação de mestrado em História de Iraci Pereira Gomes que destacava, inclusive a existência de postos de atração do Serviço de Proteção ao Índioem Pouso Bonito – comunidade rural próxima ao centro de General Carneiro – no início do século XX. 

Ribas (2008) ainda nos fez refletir sobre o intercâmbio cultural entre os imigrantes ucranianos e os Xokleng e também sobre a possibilidade de existência de escravização de indígenas em General Carneiro em pleno século XX, como no trecho que segue.

Ouvi, muitas vezes, a história de meu tio Luiz Stahlschmidt (Lule), quando, numa caçada de tateto, na Fazenda São Bento, em companhia do Sr. José Lourenço de Araújo, os cães acuaram uma índia que estava na copa de uma árvore em companhia de seu filhinho de cerca de oito anos. Enquanto os caçadores procuravam convencer a mãe a descer da árvore, o pequeno se atirou ao solo, sendo apanhado pelos cachorros. Os caçadores conseguiram salvar a vida da criança, que saiu mordida pelos cães de caça. A mãe terminou concordando em descer da árvore e ambos foram conduzidos até a sede da Fazenda Santo Antônio do Chopim, onde permaneceram prestando serviço.” (Ribas, 2008, p. 25).

A obra de Ribas serviu ainda para estudar a imigração ucraniana em General Carneiro onde realizamos aula de campo em lugares de memória da cidade, como na igreja e cemitério da comunidade de Marco Cinco, onde em 1892 haviam se instalado as famílias imigrantes.

O estudo da presença indígena e depois da imigração europeia em General Carneiro, ao mesmo tempo em que serviu para localizar os alunos como sujeitos históricos abriu a possibilidade de destacar com nova abordagem a questão do índio na história do Brasil e também a imigração europeia, conteúdos que eles já tinham travado contato nos anos anteriores.

A realidade socioeconômica e cultural dos alunos, bem como do município de um modo geral poderia ainda ser estudada a partir de outros assuntos: o tropeirismo e a formação das fazendas de gado a partir da conquista dos Campos de Palmas, a Guerra do Contestado e a exploração predatória da madeira em General Carneiro. Tínhamos como fontes históricas a oralidade presente no conhecimento prévio dos alunos, os lugares de memória da cidade e, mais uma vez a obra de Ribas.

O tropeirismo está bem presente na formação da História da cidade que nasceu a parir da abertura da Estratégica de Palmas. Várias comunidades de onde os alunos são oriundos se formaram dos pousos de tropas de gado que vinham de Palmas em direção a União da Vitória, Palmeira, Curitiba e Sorocaba. A análise de fontes em sala de aula resultou em saídas de campo, como na viagem a União da Vitória para conhecer o vau do Rio Iguaçu e também suscitou na abordagem sobre o trabalho dos negros escravizados na atividade tropeira a partir do trabalho de Cassius Cruz, presente no livro Memória dos povos do Campo no Paraná: Centro-Sul.

A formação das fazendas de gado e a realidade dos assentamentos de reforma agrária e da grande concentração fundiária no município serviram como base para o aprofundamento do estudo sobre a questão da terra no Brasil desde o período colonial até nossos dias.

A visitação à Cruz do Aviador, monumento em homenagem ao Capitão João Ricado Kirk na comunidade de Marco Cinco serviu para a abordagem sobre a Guerra do Contestado e a compreensão da relação deste evento histórico com a realidade socioeconômica da região.

Depois do tropeirismo, a atividade econômica que ganhou força em General Carneiro foi a exploração madeireira, realizada de maneira predatória por parte de indústrias que no momento se encontram inativas dada a escassez de matéria prima. A partir da análise de fontes, como a obra de Ribas, fotografias e relatos de alunos pudemos debater sobre este assunto destacando as heranças nocivas desta atividade econômica para o município, quais sejam a destruição da natureza, o desemprego e também o atual subemprego na atividade extrativa de pinus e eucalipto, monoculturas que ocupam grande parte do território carneirense.

Provocações para o debate
Aqui gostaríamos de pontuar duas questões para debate. A primeira é a que se refere ao estudo da História Local nos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio e a segunda é referente à construção do currículo com a participação dos alunos.

No início deste texto constatamos duas coisas no que se refere ao estudo da História de General Carneiro: a de que o conhecimento construído em séries/anos anteriores foi insuficiente e que, nós, como condutores do processo de ensino-aprendizagem tínhamos conhecimento muito pequeno sobre o assunto.Caimi (2010) nos auxilia nesta discussão trazendo algumas considerações importantes.

No que se refere ao conhecimento prévio dos alunos sobre a História Local em anos anteriores de estudo a autora pontua possibilidades de explicação para isso.

Na tradição curricular da história escolar, as histórias local e regional (reconhecidas nessa tradição, respectivamente, como história do município e história do estado) constam como temas de estudo na 3ª série/4º ano e na 4ª série/5º ano, respectivamente. Nestas séries/anos, as crianças encontram-se numa faixa etária entre 8-11 anos, em condições limitadas para compreenderem a complexidade das abordagens político-econômicas e socioculturais. (CAIMI, 2010, p. 69).

Essa constatação pode nos fazer compreender o despertar do “desejo” nos alunospara o estudo da História e realidade da comunidade em que estão inseridos.

Quanto ao pouco conhecimentoque tínhamos sobre a História de General Carneiro, a autora sinaliza como explicação a realidade da organização curricular dos cursos de História, onde a História Local fica relegada às possibilidades de estudo dentro dos anos de duração da graduação.

Nos cursos de graduação em História (...) os estudos regionais são consubstanciados, via de regra, em uma ou duas disciplinas obrigatórias, ao passo que a história local fica circunscrita, invariavelmente, ao rol de disciplinas eletivas/optativas. (CAIMI, 2010,p. 70).

Essas questões aliadas à parca produção de material didático sobre História Local, bem como a inexistência na maioria dos municípios de arquivos públicos ou outra entidade capacitada para preservação de documentos e fontes históricas acabam por dificultar o trabalho em sala de aula. No entanto, o estudo desta temática pode melhorar o interesse dos alunos pela construção do conhecimento histórico. Vale a conclusão com essa passagem de Caimi (2010, p. 69):

(...) os estudos de história local constituem o ponto de partida da aprendizagem histórica, uma vez que permitem a abordagem dos contextos mais próximos em que se inserem as relações sociais entre os professores, os estudantes e o meio. Nessa perspectiva, o ensino-aprendizagem da história local configura-se como um espaço-tempo de reflexão crítica acerca da realidade social e, sobretudo, referência para o processo de construção das identidades destes sujeitos e de seus grupos de pertença.

Discutir a História Local acaba por pensarmos na organização do currículo escolar que precisa estar sempre em constante reflexão em nosso trabalho em sala de aula. Não pretendemos aqui construir uma trajetória histórica sobre o currículo escolar, mas, antes destacar a necessidade de compreendermos o currículo e transformá-lo dando maior sentido ao nosso trabalho e à relação que os alunos têm com a construção do conhecimento.Para tanto, é interessante lembrarmos uma passagem de Paulo Freire que nos auxilia nessa busca.

[...] quão importante e necessário é saber escutar. Se na verdade o sonho que nos anima é democrático e solidário, não é falando aos outros, de cima para baixo, sobretudo, como se fôssemos os portadores da verdade a ser transmitida aos demais, que aprendemos a escutar, mas é escutando que aprendemos a falar com eles. Somente quem escuta paciente e criticamente o outro, fala com ele, mesmo que, em certas condições, precise de falar a ele (FREIRE, 2006, p.113).

A organização curricular é bem mais ampla do que alojar determinados conhecimentos dentro de um espaço, assim como tradicionalmente se apresenta em forma de grades curriculares. O currículo é um artefato cultural que não dissocia conhecimento e poder, por isso, está impregnado de escolhas, num processo de seleção e validação que não é neutra. Como aponta Silva (2003, p.150)

O currículo é lugar, espaço, território. O currículo é relação de poder. O currículo é trajetória, viagem, percurso. O currículo é autobiografia, nossa vida, curriculum vitae: no currículo se forja nossa identidade. O currículo é texto, discurso, documento. O currículo é documento de identidade.

Dentre as várias concepções de currículo, a teoria pós-crítica é que consegue nos auxiliar na efetivação de conhecimentos relevantes ao nosso trabalho e às expectativas dos alunos diante do conhecimento.

Tal perspectiva curricular pode representar uma ruptura com a fragmentação do conhecimento, a homogeneidade, a hierarquização dos saberes, a linearidade, a disciplinaridade. Um currículo que se constrói num movimento dialógico que propicia que o mesmo seja costurado, tecido, com as vozes dos sujeitos, do lugar onde as práticas educativas se efetivam. A construção dos conhecimentos se enreda a outros fios já presentes nas muitas redes de conhecimento que são tecidas a partir de todas as experiências que vivemos de todos os modos como nos inserimos no mundo.

A aprendizagem é uma tessitura que não pode ser controlada e desafia-nos à superação dos processos educativos normatizadores, pois, a apropriação dos conhecimentos está intrinsecamente vinculada à atribuição de significado dado aos mesmos pelos sujeitos. Por isso é necessário centrar o trabalho pedagógico no processo de significação do conhecimento, em que os “conteúdos” precisam ser compreendidos em seu significado social. Onde o “como” se faz é, também, o “conteúdo”. Isso não significa apenas ficar em torno dos interesses dos educandos, o educador leva em conta, dialoga, com esses interesses, mas também considera as suas necessidades educativas.

Ao partirmos da História Local, dialogando com o universo de significados atribuídos pelos alunos ao seu contexto sociocultural, com as possíveis lacunas na aprendizagem de “conteúdos” em séries anteriores pudemos vivenciar relações de ensino e aprendizagem na disciplina de História nas quais o conhecimento tornou-se mais significativo na medida em que este foi, também, construído com os alunos não apenas transmitidos de forma mecânica.

Outro aspecto relevante a destacar desta experiência está em evitarmos qualquer interpretação reducionista seja do ensino de História apenas como ensino de História Local ou na ideia equivocada de que os alunos são os únicos sujeitos definidores dos conhecimentos a serem estudados. Quanto ao ensino da História Local destacamos uma rica contribuição da Paulo Freire ao se referir a relação entre o local e o universal: 

Creio que o fundamental é deixar claro ou ir deixando claro aos educandos essa coisa óbvia: o regional emerge do local tal qual o nacional surge do regional e o continental do nacional como o mundial emerge do continental. Assim como é errado ficar aderido ao local, perdendo-se a visão do todo, errado é também pairar sobre o todo sem referência ao local de onde se veio. (1992, 87-8).

Assim a compreensão da História Local pode proporcionar uma rica experiência de sob a qual os alunos sejam reconhecidos como sujeitos do processo de sua aprendizagem, considerados em suas leituras da realidade, em suas dificuldades de aprendizagens e nas suas condições matérias de existência.

Ainda quanto à participação na definição dos conteúdos das aulas de História, lembremos mais uma vez Freire que nos ensina que a “leitura do mundo é anterior a leitura da palavra” (1992, p.79), ou seja, o universo de significados, saberes e experiências culturais dos educandos trazidos para a sala de aula no diálogo com o estudo sobre a História Local ensinam muito mais que “conteúdos”e visam proporcionar a aprendizagem do pensar sobre si, sobre o mundo e sua condição existencial, portanto, também como sujeitos históricos.

REFERÊNCIAS
CAIMI, F.E. Meu lugar na história: de onde eu vejo o mundo? In: OLIVEIRA, M.M.D. (Org.) História: ensino fundamental. Braília: Ministério da Educação, 2010.
CRUZ, C.M. Memórias de dependência e liberdade em comunidades quilombolas. In:Memórias dos povos do campo no Paraná – centro sul./ PORTO. L. (Org.), SALLES, J. O. (Org.), MARQUES, S. M.S. (Org.). Curitiba: ITCG, 2013.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
__________ Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1992.
GOMES. I.P. Os Xokleng do Rio dos Pardos. Dissertação de mestrado. Maringá: Mimeo, 2010.
MOTA, L.T. As guerras dos índios Kaingang: a história épica dos índios Kaingang no Paraná (1769-1924). Maringá: EDUEM, 1994.
PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares Estaduais: História. Curitiba: Imprensa Oficial, 2008.
________ Arquivo Público. Catálogo seletivo de documentos referentes aos indígenas no Paraná provincial: 1853-1870. Curitiba: Imprensa Oficial, 2007.
RIBEIRO, D. Os índios e a civilização: a integração das populações indígenas no Brasil moderno. São Paulo: Cia das Letras, 1996;
RIBAS, J.O. História do município de General Carneiro. General Carneiro: Kaygangue; 2008.
SILVA, T. T. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.

PERGUNTAS

Ao final dessa experiência, quais conclusões você tirou dela? Foi dentro das expectativas dos alunos? Como eles reagiram ao conhecer um pouco mais sua própria história? por Aristides Leo Pardo

Caro Aristides Leo Pardo. Obrigado pela leitura do texto e pelas perguntas.
Ao final de nossa experiência em sala de aula pudemos refletir sobre o grande distanciamento que há entre o currículo e a realidade da escola e dos alunos. Infelizmente, a maneira como está organizada a escola é uma grande amostra da educação autoritária, tirânica, já que são raríssimas as experiências em que os alunos e alunas participam da elaboração do trabalho que ocorrerá durante o ano letivo. E, se não participam, não encontram proximidade com o que estarão estudando no decorrer do ano letivo ou, na maioria das vezes, no decorrer de sua vida escolar. Obviamente que não poderemos atribuir aos alunos e alunas a definição dos assuntos a serem estudados nas aulas de História a partir somente da demanda, dos desejos deles. Mas, precisamos buscar mecanismos para faze-los participantes da organização do processo.  

Quanto à expectativa dos alunos e alunas e a reação ao saberem mais sobre a História Local, pudemos perceber a valorização da ideia por parte da maioria. Uma aluna, inclusive contou que em casa conversou com o avô sobre o que estudou na escola sobre os primeiros imigrantes e sobre o tropeirismo e que o avô detalhou coisas que não discutimos em sala de aula. O que quer dizer que ela se sentiu valorizada em razão de um membro da família dela ter ligação direta com um tema abordado em sala de aula sobre a história de sua cidade.

Primeiramente gostaria de parabenizá-los pelo trabalho desempenhado, eu comecei a graduação em História esse ano, e algumas coisas me fizeram perceber que não possuo nenhuma lembrança de ter estudado a história do município onde resido. Pode ser que até tenha tido esse conteúdo no ensino fundamental, e como foi dito no artigo, na citação de Caimi, ainda não possuísse maturidade suficiente para entender determinados assuntos. Ensinar história aos alunos, a partir da realidade em que estão inseridos, pode contribuir para que o interesse deles seja expandido para outros assuntos históricos? por Letícia Mello

Cara Letícia Mello, obrigado pela leitura do texto, pelo elogio e por sua pergunta.
Para respondê-la vou me utilizar de uma passagem em minha vida escolar, a qual não mencionei no texto. Durante os anos finais de meu Ensino Fundamental na Escola Estadual Inocêncio de Oliveira, no Bairro São Sebastião, em União da Vitória, tive como professor de Matemática Carlos Alberto Polsin que foi fundamental  - e hoje percebo isso - para a minha atuação no magistério. Em cada novo assunto abordado nas aulas de sua disciplina ele explicava onde estaríamos utilizando aquilo em nossa vida futura. Assim, eu tinha muito gosto em estudar Matemática pois, de acordo com as explicações do professor, aquilo teria tudo a ver com a minha vida, com o meu futuro.    
Trazendo isso para nossa área, História, o exercício herdado do meu antigo professor de Matemática tem profunda ligação com o interesse maior dos alunos e alunas para o estudo de nossas temáticas, além de ser também uma prática menos autoritária na relação professor-aluno, já que deixa a turma a vontade para poder indagar porque estudar esse ou aquele assunto, qual a importância dele, o que tem a ver com a minha vida, etc.
Como sabemos, todo o conhecimento historicamente construído é digno de ser aprendido por todos nós. No entanto, se não conseguimos fazer com que nossos alunos e alunas percebam o sentido disso, nosso trabalho também torna-se sem sentido. E nada melhor para percebermos a importância da História do que sabermos de nós mesmos, de nossa História, da construção do nosso "ao redor" pois, a partir disso poderemos querer saber mais, ir mais além, ter visões mais abrangentes, estudar outros temas.

Muitos alunos não gostam das aulas de História porque não conseguem entender o que isso faz relação com o mundo em que ele vive hoje. A História Local é de extrema importância porque faz parte da vivência dos alunos. Antes de partir para o todo, ou a história global, sou a favor de trabalhar a parte onde o aluno está inserido. Talvez assim ele consiga entender a importância do passado para o presente. Pena que nem todo o corpo escolar dá abertura para que possamos trabalhar com qualidade. por Noeli Zettel

Cara Noeli Zettel.
Obrigado pela leitura do texto e por sua colocação. Em nosso trabalho em sala de aula precisamos exercitar o diálogo com os alunos e alunas, instigar para que falem, reclamem, interroguem. Isso fará com que encontrem sentido
 nas temáticas estudadas e também na importância da escola para eles/elas. Ao longo do ano gosto de "cobrar" de minhas turmas avaliações escritas sobre as aulas de História, sobre minha atuação em sala de aula. Nas primeiras vezes que fiz isso, percebi que eles não falavam o que queriam. Limitavam-se a elogiar meu trabalho ou escreviam pouquíssimas coisas. Porém, ao passo que foram ganhando confiança, nas avaliações futuras, acabaram fazendo críticas, sugestões, dizendo o que queriam saber e o que achavam desnecessário nas aulas de História.
Creio que, se alunos e alunas souberem mais sobre a história deles mesmos, do local onde vivem, da construção da sua realidade socioeconômica e cultural, estarão bem mais abertos para a compreensão da importância de outros conteúdos de nossa área de conhecimento.      

16 comentários:

  1. Muitos alunos não gostam das aulas de História porque não conseguem entender o que isso faz relação com o mundo em que ele vive hoje. A História Local é de extrema importância porque faz parte da vivência dos alunos. Antes de partir para o todo, ou a história global, sou a favor de trabalhar a parte onde o aluno está inserido. Talvez assim ele consiga entender a importância do passado para o presente. Pena que nem todo o corpo escolar dá abertura para que possamos trabalhar com qualidade. Noeli.

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    1. Cara Noeli Zettel.
      Obrigado pela leitura do texto e por sua colocação. Em nosso trabalho em sala de aula precisamos exercitar o diálogo com os alunos e alunas, instigar para que falem, reclamem, interroguem. Isso fará com que encontrem sentido
      nas temáticas estudadas e também na importância da escola para eles/elas. Ao longo do ano gosto de "cobrar" de minhas turmas avaliações escritas sobre as aulas de História, sobre minha atuação em sala de aula. Nas primeiras vezes que fiz isso, percebi que eles não falavam o que queriam. Limitavam-se a elogiar meu trabalho ou escreviam pouquíssimas coisas. Porém, ao passo que foram ganhando confiança, nas avaliações futuras, acabaram fazendo críticas, sugestões, dizendo o que queriam saber e o que achavam desnecessário nas aulas de História.
      Creio que, se alunos e alunas souberem mais sobre a história deles mesmos, do local onde vivem, da construção da sua realidade socioeconômica e cultural, estarão bem mais abertos para a compreensão da importância de outros conteúdos de nossa área de conhecimento.

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  3. A História local é sem dúvidas uma das formas pelas quais o historiador ou professor de História deve atrair os alunos a ter interesse em diferentes assuntos históricos, no entanto as localidades pequenas são sempre carentes da história local, arremetendo a história regional ou ainda nacional ou mundial. Qual sua principal dica para a exploração da história local com veracidades de fatos que contribua para o processo de ensino- aprendizado?

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    1. Olá Mazilda! Obrigado pela leitura do texto e por sua pergunta. De fato, você toca numa questão sentida, inclusive, na cidade em que trabalho, General Carneiro - PR. Apesar de termos a obra referenciada no texto, História do município de General Carneiro, de Joaquim Osório Ribas, não há outras publicações sobre a história do município ou arquivo público municipal. Há sim os lugares de memória. Há sim a História Oral. Há sim a história de vida de cada aluno e aluna. A partir disso podemos estudar a História Local e buscar conectá-la a assuntos mais abrangentes além de possibilitar a reflexão sobre várias questões: por quê ninguém escreveu nossa história? Ou, por quê foi escrita dessa maneira? O que falta escrever em nossa história? É importante isso ou aquilo em nossa história? O que podemos fazer para contar ou recontar nossa história? Por quê isso é importante?
      Creio, cara Mazilda, que isso pode ser uma boa tentativa de trabalho.

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  6. Rafael Moura Roberti12 de maio de 2015 às 21:25

    A história local é um ponto de partida e não um fim em si mesma. Nunca. "O tejo não é o rio que corre na minha aldeia" Mas há outras aldeias, outros rios, outros outros nessa aldeias. O tejo desemboca nalgum mar que nos leva ao outro rio, a outra aldeia, ao outro.

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    1. Olá Rafael. Obrigado pela leitura do texto e por seu comentário.
      Você tem razão, a história local é um ponto de partida. E é isso que este relato de experiência tenta ressaltar, partir da história local para recortes mais abrangentes.
      Percebo que a maioria dos alunos e alunas está afoita por encontrar caminhos, sentido, relação do que estudam com a sua vida. E isso não é somente em nossa área de conhecimento. O exercício do diálogo tentando fazê-los parte integrante da contrução do conhecimento é fundamental.

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  7. Qual a sua principal dica para os alunos explorar a sua historia local ,e buscar assuntos mais abrangentes e mais aberto para se aprofundar nos estudos sobre o Brasil desde o período colonial até os dias de hoje? Melania Presa da Silva

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    1. Melania! Obrigado pela leitura do texto e pela pergunta.
      Quanto aos alunos explorarem a história local, penso ser fundamental a valorização dos relatos orais, do saber acumulado nas pessoas mais velhas da família, da comunidade. No município em que trabalho, quando saiu a publicação de um livro sobre a história do município, soube de pessoas idosas (avós de uma aluna) que leram a obra e contestaram muitas coisas ali escritas. Esse exercício de fazer a comparação entre o escrito e o contado oralmente pode suscitar o interesse pelo estudo e contestação do que temos escrito sobre períodos mais remotos da história do Brasil, por exemplo. Obviamente que não haverá pessoas para fazer relatos orais sobre o século XVI mas, escrito, não há apenas uma versão dos fatos e é isto que é importante saber.
      Outra dica importante para, a partir da história local despertar o interesse por outros temas é o aproveitamento dos recursos tecnológicos. Os celulares que a maioria dos alunos possui tem recursos que podem ser muito bem aproveitados na exploração da história local. Eles podem fazer entrevistas, pequenos documentários, animação, fotografias a partir de elementos da história local e socializar na rede ou com colegas em sala de aula.

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  8. O que fazer para que haja interesse da comunidade escolar em aprender sobre sua história local e antepassados?

    Sonia Maria Magni da Silva

    Obs. Pergunta referente ao dia 11/05 que não apareceu na postagem.

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    1. Cara Sonia! Obrigado pela leitura do texto e por sua pergunta.
      Uma atividade bacana que realizamos com uma turma de sexto ano foi, primeiramente, resgatar a história de cada aluno ou aluna. Enviei para casa um pequeno "questionário" que deveria ser preenchido com a ajuda de familiares. Ali eles deveriam responder o dia, a hora e o local de nascimento. Com quantos quilos nasceu, se era chorão, se mamava muito quando bebê, qual a primeira palavra que aprendeu a falar, quem escolheu o nome, porque escolheu esse ou aquele nome, dentre outras perguntas. Foi bem gratificante. Na aula seguinte, mesmo sem eu pedir, várias alunas e alunos trouxeram fotos de quando eram bebês, roupinhas, carteirinhas de vacinação. Aproveitei para dizer que aquilo tudo eram as fontes históricas sobre eles e comparei-as com as fontes históricas e o trabalho do historiador. Como sentimos que o trabalho estava dando certo, partimos para outras investigações: eles deveriam saber como os pais se conheceram, qual a reação quando souberam da gravidez, qual a profissão dos avós, se nasceram nas cidade, se vieram de outra região, como brincavam na infância, enfim, diversas perguntas a serem respondidas com a ajuda de familiares para serem socializadas em sala de aula. Depois disso partimos para o estudo da história da escola e da comunidade onde ela está inserida.
      Creio que cada um da comunidade escolar precisa se perceber como importante e também como sujeito histórico. Assim passará a perceber a importância de nossa área de conhecimento e a importância da valorização da memória.

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  9. Lúcia, o seu relato é inspirador. Aqui na Uefs temos apenas uma disciplina na graduação em história destinada a História da Bahia. Há discussões quanto a pequena carga horária atribuída a mesma. No ensino fundamental observo a história local despontar apenas nas séries inicias. Pergunto se não devemos pensar em estratégias para a que a história local possa servir como fio condutor para as discussões das demais histórias consideradas geral, global, do Brasil etc,etc.?

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    1. Ana Maria! Obrigado pela leitura do texto e por sua pergunta!
      Aqui no Paraná nós temos uma Lei Estadual que obriga o estudo da História do Estado, que você pode conferir aqui http://www.educacao.pr.gov.br/arquivos/File/deliberacoes/deliberacao072006.PDF .
      O que ocorre é que o Estado não da formação para educadores/as e isso acaba prejudicando o cumprimento da Lei. Em nossa graduação, concluída em 2004, tivemos História do Paraná no primeiro e segundo ano.
      Conforme destacamos no relato de nossa experiência, o estudo da história local pode contribuir muito para o despertar do estudo de temas mais abrangentes. Precisamos insistir nisso e também cobrar das secretarias de Educação mais formação e mais valorização deste tema.

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  10. Lúcia, o seu relato é inspirador. Aqui na Uefs temos apenas uma disciplina na graduação em história destinada a História da Bahia. Há discussões quanto a pequena carga horária atribuída a mesma. No ensino fundamental observo a história local despontar apenas nas séries inicias. Pergunto se não devemos pensar em estratégias para a que a história local possa servir como fio condutor para as discussões das demais histórias consideradas geral, global, do Brasil etc,etc.?

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